Demandas fazem parte da campanha salarial dos docentes e foram tema de audiência pública da Comissão de Educação nesta terça (26).
Baixo orçamento de universidades públicas impede a autonomia universitária e faz parte da pauta de reivindicações da campanha salarial dos docentes em 2024, conforme explicaram convidados de audiência pública na manhã desta terça-feira (26/3/24).
Durante a reunião, realizada pela Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), representantes do Poder Executivo ressaltaram dificuldades em atender aos pleitos por limitações impostas pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Os convidados defenderam que sem orçamento adequado não é possível que a universidade tenha autonomia. Segundo o presidente da Associação dos Docentes da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), Túlio Lopes, o orçamento anual da Uemg é R$ 404 milhões.
Em comparação com as universidades estaduais paulistas, ele indicou que o valor é menos de 5% do destinado à USP, que tem orçamento anual de R$ 8,4 bilhões, e cerca de 10% da Unicamp e da Unifesp, cujos orçamentos estão em torno de R$ 4 bilhões.
Já comparada com a UFMG, o orçamento é um terço da universidade federal, que seria atualmente de R$ 1,5 bilhão. Isso, destacou o convidado, se torna uma distorção ainda maior se observado que houve uma expansão da atuação nos últimos anos e atualmente a Uemg está em 18 municípios mineiros.
Segundo ele, com essa realidade, as obras estão paradas, faltam condições de infraestrutura e de material para o ensino, bem como condições para pagar os trabalhadores. Uma das propostas é garantir que 2% do orçamento estadual seja destinado à Uemg e à Unimontes.
Segundo Túlio Lopes, nos últimos 10 anos, o recursos destinados às duas instituições variaram entre 0,3% e 04% do orçamento. A situação, segundo ele, tem piorado, com cortes orçamentários principalmente desde 2022. O presidente da Associação dos Docentes da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), Ildenilson Barbosa, afirmou que o orçamento já minguado dessa instituição sofreu um corte de 30% em 2024.
Os cortes, de acordo com os convidados, impactam nos salários dos trabalhadores, mas também na infraestrutura dos campi e na assistência estudantil. Idelnilson Barbosa reforçou a ideia de que sem orçamento não há autonomia e lembrou, por exemplo, que o governo estadual tem barrado inclusive o reconhecimento de dedicação exclusiva para os professores, a revelia das decisões na gestão das universidades.
Em relato das tentativas de negociação com o governo nos últimos anos, Ildenilson lembrou que depois de duas longas greves, em 2016 e em 2018, conseguiu-se um acordo, homologado pelo Tribunal de Justiça. Os pontos acordados, porém, não estariam sendo cumpridos pelo Poder Executivo.
Um exemplo é o de quase 50 professores que tiveram sua dedicação exclusiva reconhecida e publicada em Diário Oficial e até hoje não receberam os valores relativos a esse reconhecimento.
A dedicação exclusiva é considerada essencial para que os professores tenham condições efetivas para se dedicar às atividades de ensino, pesquisa e extensão, o tripé do ensino público superior de acordo com Jennifer Santos, da diretoria nacional do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes).
Não autorizar o reconhecimento dessa dedicação, bem como impedir o aumento das cargas horárias de 20 para 40 horas semanais são algumas das estratégias do governo estadual, apontadas pelos convidados, que impactam nos salários dos docentes e na autonomia universitária.
Convidados expõem defasagens salariais
Os participantes da audiência pública explicaram que a busca por melhorias no orçamento das universidades faz parte da campanha salarial de 2024. Para Túlio Lopes, da Uemg, negociações salariais deveriam ser feitas diretamente com as reitorias, mas sem orçamento adequado, isso não é possível.
Ele indicou a falta de reajuste nos últimos anos e salientou a grande defasagem na remuneração dos profissionais. Segundo Túlio Lopes, há editais para professores abertos sem procura, dados os baixos salários. O problema é maior nos municípios menores e resulta em falta de professores em alguns cursos e campi.
Por sua vez, Ildenilson Barbosa, da Unimontes, citou casos em que professores com doenças graves, como câncer, evitarem se licenciar para os tratamentos porque os cortes salariais chegam a 40%. Isso porque o vencimento básico da categoria é muito baixo, de forma que não se consegue abrir mão de verbas indenizatórias, como auxílio-alimentação e gratificações.
Os técnicos administrativos, representados por Sidnéia Mainete, também reivindicaram negociações acerca dos salários. Ela apresentou comparações entre os vencimentos iniciais das carreiras e mostrou que, para uma jornada semanal de 40 horas, os técnicos da Uemg recebem valor abaixo do salário mínimo.
Os valores são menores do que os recebidos por técnicos do sistema de ensino básico. Um dos pedidos é que a escolaridade seja considerada para fins de melhorias salariais.
Além dos baixos salários, os técnicos também sofrem com efetivo insuficiente. Sidnéia Mainete afirmou que, apesar de as universidades mineiras terem se expandido e chegado a novos municípios, o número de cargos não foi ampliado. Segundo ela, hoje são apenas 258 cargos técnicos na Uemg e apenas 83 deles estão ocupados por servidores efetivos.
Reitores pedem valorização, mas salientam vitórias dos últimos anos
O reitor em exercício da Uemg, Thiago Ferreira, ressaltou a importância da valorização das carreiras, mas destacou que as universidades estaduais conseguiram algumas vitórias junto ao governo ao longo dos últimos anos. Ele citou a criação do Plano de Assistência Estudantil, criado em 2017 a partir da mobilização de trabalhadores e estudantes.
Sobre a carreira docente, o convidado ressaltou reposicionamento da carreira em 2012 e reposição inflacionária de 10% em 2022. Ele também citou a autorização para realização de concurso para cerca de 300 vagas para professores. O vice-reitor da Unimontes, Dalton Rocha, também citou a abertura da vagas para concursos como vitória. Ele lembrou que o último concurso foi há mais de dez anos.
No mesmo tom, o deputado Cassio Soares (PSD) indicou que é preciso valorizar as carreiras dos servidores da educação superior no estado. Ele lembrou que essa carreira é uma das mais defasadas em termos remuneratórios no estado, ao lado das carreiras da Secretaria e Meio Ambiente e do Departamento de Estradas de Rodagem.
Apesar disso, o parlamentar defendeu o atual governo e disse que as universidades tiveram vitórias nos últimos anos. Ele citou a abertura de concursos para alguns cargos de professores, mas concordou com os convidados e lamentou a falta de candidatos em alguns casos, resultado das condições ruins da carreira.
Cássio Soares também apontou planos para abertura de restaurantes universitários em alguns campi, que devem acontecer nos próximos meses.
Representantes do governo dizem não poder atender a pleitos
Representaram o Poder Executivo a assessora-chefe de relações sindicais da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag), Helga de Almeida, e Leandra Martins, assessora-chefe de Ensino Superior da Secretaria de Educação.
A primeira reforçou que lamenta as situações relatadas, reconheceu os problemas, mas disse que os pleitos não podem ser atendidos diante das limitações da Lei de Responsabilidade Fiscal. A segunda se comprometeu a ampliar o diálogo no âmbito da pasta de educação.
As deputadas Beatriz Cerqueira (PT) e Lohanna (PV) se solidarizaram com as demandas e lamentaram as dificuldades de avançar nas negociações com o governo estadual.
Beatriz Cerqueira pediu apoio dos representantes do governo para projetos de lei e emendas atualmente em tramitação com vistas a melhorar algumas das situações citadas. Um exemplo é o Projeto de Lei (PL) 3983/22, que entre outras propostas, garante a promoção por escolaridade para os técnicos administrativos.
A parlamentar também citou emendas apresentadas ao PL 875/23, que autoriza a contratação temporária de professores pelo Poder Executivo para atender a necessidade excepcional.
Uma das emendas é para garantir que os contratos reconheçam a titulação para os docentes, outra para regulamentar o aumento da carga horária de 20 para 40 horas.