Para conselhos, vacinação contra Covid-19 não é transparente

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Representantes de médicos, dentistas, enfermeiros e fisioterapeutas ouvidos em CPI denunciam falta de coordenação.

Deputados da CPI dos Fura-Filas da Vacinação ouviram representantes de entidades da área de saúde – Foto: Reprodução

A presidenta do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG), Cibele de Carvalho, disse, nesta terça-feira (30/3/21), que nem todos os trabalhadores da linha de frente no atendimento a pacientes com Covid-19 foram vacinados em Minas Gerais e que a situação pior em imunização na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) está na Capital.

Ela afirmou reiteradas vezes que falta clareza na definição de procedimentos para a vacinação e que cada ente federado tem comportamentos diferentes. Cibele foi ouvida pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Fura-Filas da Vacinação acerca dos critérios estabelecidos para definição dos grupos prioritários para aplicação da vacina.

Foram ouvidos também pela CPI da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) representantes dos conselhos profissionais de odontologia, de enfermagem e de fisioterapia e terapia ocupacional. Em geral, todos apontaram a falta de coordenação geral para a imunização, tendo a representante do CRM esclarecido que há dificuldades também para que o órgão obtenha informações sobre o cenário atual.

Ela frisou que os números sobre a situação da vacinação ainda estão sendo levantados, mas adiantou que a situação mais crítica é a de Belo Horizonte. Cibele disse à CPI que a Capital tem cerca de 140 mil trabalhadores em saúde, dos quais somente 86 mil teriam sido vacinados até o último sábado (27/3), quando a vacina foi aplicada àqueles com mais de 60 anos.

Isso, mesmo depois que o então titular da Secretaria de Estado de Saúde (SES), Carlos Eduardo Amaral, ter informado, em reunião no fim de janeiro, que até o fim de fevereiro todos os profissionais de saúde seriam imunizados no Estado.

Somente quanto à classe médica, ela informou que há em Minas pouco mais de 20 mil médicos, dos quais 60% teriam sido vacinados até o último sábado.

A informação foi dada em resposta a questionamento do deputado Guilherme da Cunha (Novo). O parlamentar disse que, ao analisar nesta terça-feira (30) o vacinômetro do Estado, que expõe o número de doses recebidas e aplicadas em Minas, constatou que haveria um excedente superior a 180 mil doses, segundo ele a diferença entre recebidas e ainda não usadas. A quantidade é suficiente para vacinar todos os profissionais de saúde.

Em 19 de fevereiro, data em que o ex-secretário de Estado de Saúde e servidores da área administrativa da SES teriam sido vacinados, motivando a instalação da CPI, o CRM enviou ofício à pasta manifestando preocupação acerca dos critérios adotados no Estado para a imunização. Como não houve resposta imediata ao ofício, a questão foi então levada ao Centro de Operações de Emergências em Saúde (Coes-MG).

A médica ainda disse ter levado ao conhecimento do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) toda a situação de atrasos e de falta de transparência quanto a datas e prioridades na vacinação.

Disse, também, que foi relatado ao MPMG o fato de que médicos afastados por idade de risco ou comorbidades não puderam voltar ao trabalho, mesmo num cenário de grande demanda por atendimento, porque não tinham ainda recebido a vacina em 19 de fevereiro, quando teria havido a vacinação de servidores administrativos da SES. 

Médica diz que falta uma conduta única

Para Cibele de Carvalho, sem padrão para procedimentos e prioridades, o número de mortes pode aumentar – Foto: Reprodução

Em respostas a questionamentos do relator da CPI, deputado Cássio Soares (PSD), sobre se o CRM está fiscalizando o cumprimento da ordem para a vacinação, Cibele disse que o órgão enviou ofícios a quase 300 instituições de saúde pedindo informações a respeito. “Nem todos responderam e estamos em momento de reiterar esse pedido, de envio da lista dos vacinados e dos não vacinados”, disse ela.

“O que posso dizer é que apesar de todo mundo falar que segue o Plano Nacional de Vacinação (PNI), a gente vê uma certa diferença na prioridade dada aos trabalhadores de saúde entre os municípios mineiros”, afirmou Cibele.

“Não há uma fala única. A situação é muito grave, e se não unirmos e tivermos uma linha de conduta, com certeza teremos muito mais mortes do que teríamos”, insistiu a médica, para quem União, Estado e municípios não estão atuando de forma padronizada, provocando confusão e desentendimentos acerca de procedimentos e priorizações.

O deputado Roberto Andrade (Avante) questionou o papel de cada nível de governo e registrou situações como a de trabalhadores da Hemominas que ainda não teriam sido vacinados. 

O presidente da CPI, deputado João Vítor Xavier (Cidadania), observou que pelas falas há falta de sintonia entre a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e a SES, o que resulta no fato de médicos da linha de frente não terem sido vacinados, ao menos até fevereiro.

O vice-presidente da comissão, deputado Ulysses Gomes (PT), também manifestou preocupação sobre a imunização de médicos.

Segunda dose – O deputado Noraldino Júnior  (PSC) questionou a representante do CRM sobre se quem furou a fila teria a saúde prejudicada se não vier a receber a segunda dose, defendendo que ela seja aplicada, sem prejuízo de eventuais punições. O deputado Carlos Pimenta (PDT) manifestou posicionamento semelhante. Cibele disse que a resposta imunizatória será prejudicada no caso de não aplicação da segunda dose.

Classificando de graves as informações apresentadas pela presidenta do CRM, o deputado Sargento Rodrigues (PTB) fez questionamentos acerca da atuação do conselho na fiscalização da imunização e do cumprimento das prioridades.

Cibele disse que não há definição de critérios claros para o rastreio e que o Estado falhou ao não planejar e acompanhar o desenrolar da imunização. 

Já em resposta ao deputado Zé Guilherme (PP), a presidenta do CRM acrescentou que o órgão fez fiscalização in loco em alguns hospitais a respeito da vacinação. 

Enfermagem aponta desprezo e falta de vacinação

O presidente do Conselho Regional de Enfermagem de Minas Gerais (Coren-MG), Bruno Souza Farias, lamentou o desprezo com que ele considera que os profissionais da categoria estão sendo tratados pelos governos. 

Segundo ele, nem a SES e nem as prefeituras mineiras estariam priorizando os profissionais de enfermagem para a vacinação. Reclamou, ainda, que solicitou a prioridade ao órgão estadual e à Prefeitura de Belo Horizonte, mas sequer recebeu resposta.

Bruno afirmou que o Coren tem recebido uma média de 90 denúncias diárias de falta de imunização dos profissionais. Uma delas denuncia que no Hospital João XXIII, o maior e principal hospital público de Minas, a maioria dos servidores da enfermagem ainda não foi vacinada. 

Ele disse ainda que o órgão tem recebido denúncias de falta de pagamento de adicional de insalubridade a profissionais do Samu e de excesso de trabalho em diversas instituições. 

“Tem técnico que está há 3 meses sem voltar para casa, com medo de contaminar familiares”, lamentou, acrescentando que entre 5% e 10% dos profissionais estão sendo afastados por adoecimento mental, em função do estresse no trabalho durante a pandemia.

O deputado Cássio Soares afirmou que solicitará ao Estado informações a respeito da denúncia sobre o Hospital João XXIII.

Dentistas também denunciam falta de coordenação

Raphael Castro Mota, presidente do Conselho Regional de Odontologia de Minas Gerais (CRO-MG), também criticou a falta de uma coordenação central para a campanha de vacinação. Em sua opinião, o governo estadual, que é o responsável pela distribuição das doses aos municípios, deveria fazer esse trabalho para evitar os diferentes problemas que têm ocorrido, como o desvio de vacinas para grupos não prioritários.

Ele afirmou que o conselho tem recebido muitas denúncias sobre essas irregularidades, que são difíceis de serem comprovadas porque não há transparência no processo de imunização. 

Como a vacinação tem sido colocada na responsabilidade das prefeituras, muitas não estão seguindo as regras do programa nacional e a maioria tem destinado vacinas a idosos, em detrimento dos profissionais de saúde, disse ainda.

O dentista criticou também o plano federal, citando, como exemplo, a não prioridade de professores e garis e a demora em classificar os demais profissionais de saúde que devem ser priorizados na fila de imunização. 

Ele estima que, em Minas, 46% da categoria foi vacinada.

Fisioterapia aponta preferência por rede pública

O presidente do Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional do Estado (Crefito), Anderson Luís Coelho, disse à CPI que, de acordo com o PNI, deveriam ter sido priorizados todos os trabalhadores com vínculo ativo nos serviços de saúde, inclusive os de apoio domiciliar e de áreas administrativas, o que não estaria sendo respeitado no Estado. 

De acordo com ele, uma “parcela ínfima” dos profissionais de fisioterapia e terapia ocupacional foi vacinada. Ele ressaltou a importância do trabalho desses profissionais nas UTIs e também no processo de reabilitação pós-internação, lembrando que há cerca de 30 mil desses trabalhadores no Estado. 

Anderson informou que o Crefito recebeu diversas denúncias em relação a critérios de vacinação no Estado, entre as quais a não imunização de profissionais que trabalham em instituições de longa permanência de idosos.

Ele também criticou o que chamou de “preferência de vacinação” a profissionais da rede pública em detrimento daqueles da rede privada, quando o PNI não faz essa distinção. 

Requerimentos – Na reunião, foram aprovados diversos requerimentos, endereçados a diferentes órgãos do Estado, com pedidos de informações e providências. Também foram acatados requerimentos para que superintendentes de Saúde de alguns municípios do Estado sejam convidados a falar na CPI.

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