Editorial | Um sonho…

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Todos sonhamos. Às vezes até acordados. Uns sonham com um mundo melhor para todos. E alguns tentam fazer deste sonho uma realidade. Esses são os empreendedores sociais, que dedicam seu tempo para a busca de fazer acontecer oportunidades aos menos favorecidos. Nas próximas páginas, edições anteriores e nas próximas edições foram e serão mostrados exemplos destes verdadeiros heróis que contribuem com a mudança de muitas vidas.

Surge, então, o terceiro setor, entidades privadas dispostas a realizar atividades públicas, sem finalidade lucrativa, ou seja, utilizando de seu tempo e trabalho destinando-os à população vulnerável nas áreas de saúde, assistência social, educação, esporte, cultura, entre outras. Destaque-se que estas atividades são obrigações do Estado, mas que devem ser executadas de forma descentralizada e com participação social, segundo nossa Constituição Federal. Decorrem desta base constitucional as parcerias das OSC’s (Organizações da Sociedade Civil) com a administração pública, que atualmente estão reguladas segundo a lei 13.019/2014.

Até aqui, um sonho …

Entretanto (e quando esta palavra aparece precisamos ficar atentos), a administração pública tem diversas prioridades e precisa atender a uma série de realidades conforme as necessidades gerais da população e segundo seus interesses que, em tese, deve visar sempre o bem comum. Como os recursos são limitados é preciso escolher a quem se irá atender. Para o trabalho (qualquer trabalho, inclusive o social) existem custos que, se relacionados as áreas citadas, deveriam ser suportados pela administração pública. Mas, como a execução direta nem sempre é possível, ocorrem as parcerias com as OSC’s, e aí começam as preocupações.

Quem define via de regra o valor dos repasses a serem feitos nos chamamentos públicos é a administração pública. Não porque a lei assim determina. Muito pelo contrário. Pacificado está que quem deve apresentar o custo são as OSC’s parceiras, limitando a administração pública a apresentação de um valor previsto (expressão constante da lei 13.019/2014, art. 24). Mas, na prática a estória é outra: é comum ouvir “ou se acata o valor previsto ou não se executa a atividade”. Poucas OSC’s têm a coragem necessária para contrapor-se a este verdadeiro abuso de autoridade. Além disso, na prestação de contas apresenta-se apenas o valor que foi objeto dos repasses da administração pública, independentemente de quanto de fato custou aquele serviço. É uma pena que ainda tenhamos na administração pública profissionais que preferem demonstrar, desta forma, que financiam 100% dos serviços, fazendo de conta que as OSC’s não precisaram fazer das tripas coração (expressão usada para dizer que houve muito esforço) a fim de conseguir pagar as despesas assumidas.

Trabalhamos recentemente um estudo em conjunto com as OSC’s que atendem em parceria com a administração pública a área de assistência social em Franca. A realidade é assustadora: menos de 50% do custo dos serviços é coberto pelos repasses da administração pública. As OSC’s, as vezes, só percebem a defasagem na hora das demissões dos funcionários, porque não há reserva financeira para o pagamento das verbas rescisórias. E aí é tarde demais. Em alguns serviços a diferença chega a 70%. Importante registrar que nos últimos tempos foram enviadas correspondências para as entidades, posteriormente assumida como equivocada, dizendo que não poderiam ser realizadas promoções ou pedidos de doações … Também tem se tratado da possibilidade do atendimento com cobrança, o que não é bem aceito por alguns profissionais da administração pública, embora não existam impedimentos legais, cumpridas todas as formalidades e realizadas com todas suas exigências. Se alguém não as cumpre, que seja punido com a severidade da lei.

Mas vamos fazer as contas juntos: recebemos da administração pública menos do que precisamos gastar para fazer o que fazemos; não podemos pedir ajuda para a sociedade; não podemos realizar atividades que nos tragam recursos financeiros. Como iremos continuar com os serviços? A administração pública exige toda a formalidade e cumprimento das exigências e etecetera e tal. E tem mesmo a obrigação de fazer isso. Mas, sem dinheiro as OSC’s fazem o que conseguem. E quem assumirá as consequências? Quem pagará a conta que falta? As OSC’s e pronto. Não tem dúvida!

E tudo começa como um sonho…
Mas vamos continuar sonhando…

Vamos sonhar com um dia em que a administração pública, por meio das pessoas que ocupam os cargos que foram pensados para se buscar o bem comum possam perceber que devem ocorrer parcerias (na expressão mais ampla deste termo, onde um ajuda o outro). Vamos sonhar com um dia em que os valores previstos dos serviços a serem contratados sejam de fato aqueles que comportem as despesas que as OSC’s realmente têm. Vamos sonhar que as propostas da administração pública, pensando em aumentar o número de atendimentos, sejam balizadas por valores compatíveis com os custos necessários, pois, caso contrário, só aumentamos o tamanho dos prejuízos para as OSC’s e fica parecendo que a administração pública resolveu o problema da espera pelos serviços. Vamos continuar sonhando que o mundo será melhor para todos. Mas vamos sonhar isso tudo acordado. E juntos. Só assim conseguiremos transformar este sonho em uma realidade para aqueles que mais precisam.

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