Capacitação, tecnologia e individualização no ensino de pessoas com TEA

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Comissão escuta especialistas, que apresentam novos métodos e estratégias para que esse público obtenha melhor resultado na Educação. 

Na reunião, pintora autista apresentou seus trabalhos e defendeu a arte como forma de aprendizado Álbum de fotos Foto: Daniel Protzner

Na busca por melhor desempenho dos estudantes com transtornos do neurodesenvolvimento, entre eles, o do espectro autista (TEA), são desenvolvidos projetos e métodos voltados a esse público. A Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) abriu espaço para ouvir pesquisadores de universidades e professores sobre o tema, nesta quinta-feira (11/4/24). 

Requerida pelo deputado Cristiano Silveira (PT), a reunião teve como objetivo abordar essas novas estratégias de ensino, o que inclui a capacitação dos profissionais que atendem a essas pessoas. No mês de conscientização sobre o autismo, essa foi mais uma das audiências para tratar do tema e buscar soluções para os problemas que atingem o segmento. 

Adriana Borges, professora da Faculdade de Educação da UFMG, coordena o chamado PAR Digital, viabilizado por emendas parlamentares. O projeto, já disponível para implantação, é fruto de pesquisas dessa faculdade e contempla as três ações consagradas como as necessárias para tornar eficaz o ensino voltado aos alunos com deficiência: Planejar, Aplicar, Rever. 

Segundo a pesquisadora, o PAR é um software que se baseia no Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) ou Planejamento de Ensino Individualizado (PEI). Ele se organiza a partir dos princípios do Desenho Universal de Aprendizagem: Engajamento, apresentação, ação e expressão. 

Borges detalha como isso deve ocorrer nas escolas. Primeiro, busca-se o engajamento do aluno, de forma individualizada. Depois, cada professor pensa em estratégias para obter esse engamento. Por último, passa-se para a ação e expressão, com adoção do plano e posteriormente, a forma como cada estudante será avaliado. Para execução do projeto, são necessários um professor regente, com formação em pedagogia, e além disso, a formação prévia de todos os docentes. 

Autonomia

Jéssica Santana, professora doutora da UEMG de Divinópolis (Centro-oeste), afirmou que, além do desenvolvimento de conteúdos formais, o objetivo da educação inclusiva é dar aos alunos com autismo e outros transtornos maior autonomia. 

Psicóloga e coordenadora do serviço de psicologia da UEMG, Jéssica acrescentou que falta individualizar a educação desse segmento. Segundo ela, quando se faz a capacitação de professores e profissionais de apoio, parece que tudo funciona, “mas é só na teoria”, alerta. “Quando conversamos de forma individualizada, vemos que é feito um trabalho para que o profissional de apoio, muitas vezes, apenas distraia as crianças especiais, de forma que não atrapalhem as demais; e não é esse o objetivo”, advertiu.

Ela lembrou que também é essencial um forte investimento em recursos e equipamentos adaptados e tecnologias assistivas. “Ganhamos em motivação das crianças quando conseguimos engajá-las nas atividades”, garantiu ela, exemplificando com a criação da sala de recursos multisensoriais em Divinópolis. 

Como principais gargalos que dificultam a melhoria da qualidade do ensino para pessoas com transtornos ela apontou a falta de formação continuada e a insuficiência de recursos aplicados na área. Além disso, defendeu que os estudos tratem da especificidade de cada público especial, separando pessoas com TEA das que tem TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade), por exemplo. E que haja o compartilhamento entre os diversos educadores das informações obtidas.

Formação profissional

Suéllen Fernandes Coelho, coordenadora de Educação Especial e Inclusiva da Secretaria de Estado de Educação, taxou como uma pauta desafiadora a educação desse público. Considerou que cada estudante é único e precisa de estratégias específicas para que possa aprender. “Nossa intenção é eliminar as barreiras, não ser barreira”, disse. 

Ela completou que Minas Gerais possui atualmente 47 centros de formação de profissionais. As unidades contam com professores, especialistas, psicólogos, terapeutas ocupacionais para melhorar a atuação do Estado nessa área.

E o advogado e professor Willian Zanon, da Faculdade Anhanguera, destacou que nesta audiência, mais aprendeu que ensinou. Ele lembrou de frase que poderia ser aplicada à reunião: “Precisamos realizar uma desconstrução para depois reconstruir”. Defendeu que se trabalhe nas escolas o conceito de diversidade na educação, com igualdade e justiça social. E propôs que a arte, nas suas diversas expressões, e a cultura sejam utilizadas como formas de obter a atenção das pessoas com transtornos. 

Familiares de autistas falam de suas vivências 

Marcelle Resende, pedagoga e professora referência em Inclusão em Escola Construtivista, declarou que só entrou para essa área porque seu irmão foi diagnosticado como autista, e anos depois, ela mesma recebeu o mesmo diagnóstico. Na sua avaliação, uma medida importante para garantir as melhores políticas para pessoas com TEA e outros transtornos é adotar o Parecer 50 do Conselho Nacional de Educação. A norma tem como pilares o acesso, a permanência, a participação e a aprendizagem.

“Hoje, ainda há negativas de matrícula. E mesmo quando a pessoa com transtorno entra, muitas vezes, não fica, pois não há um trabalho de inclusão”, constatou. Ela fez um apelo para que o ministro da Educação, Camilo Santana, homologue o Parecer 50. Em resposta, o deputado Cristiano Silveira redigiu requerimentos com esse teor. 

Comportamentos desafiadores

Já Poliana Vieira, do Projeto Meu bebê é o Autismo, falou de seu drama como mãe de autista de 7 anos, com grau 3, o mais severo. “Sinto falta de mães aqui hoje, porque o problema fica sendo tratado teoricamente, fora da realidade”. Na sua visão, há uma incapacidade da sociedade brasileira de incluir as crianças autistas: “O que se faz quando um autista tem comportamento masturbatório compulsivo ou com outro que agride os colegas na escola? Precisamos sair da retórica e resolver esse problema”, apelou. 

Concluiu que existem estratégias de ensino capazes de beneficiar indivíduos com esses distúrbios, mas não são usadas. “Práticas educacionais com evidência científica devem ser adotadas para lidar com esses comportamentos desafiadores”, propôs. Por último, defendeu a capacitação do corpo técnico, avaliando que os profissionais de apoio conseguem resolver a maior parte dos problemas. 

Daniela Muffato, presidente da Associação Pró-autistas de São João del-Rei, falou dos desafios enfrentados com seu filho Pedro, adolescente com autismo no nível 2 de suporte, o que impõe maiores dificuldades de aprendizagem. “Já me disseram ‘o que você quer que ele aprenda?’ E eu respondia ‘tudo que as outras crianças aprendem’”, disse. 

Segundo ela, seu filho tem inteligência diferenciada para a tecnologia, mas por outro lado, não consegue escrever uma redação. “Como ele vai entrar para a faculdade? Precisamos criar ferramentas”, sugeriu.

Invisibilidade

Também membro da Aspas, Bruno Grossi questionou porque não se veem as pessoas autistas com nível 2 e 3 de suporte. Segundo ele, esses indivíduos e também os autistas pretos, os com diversidade sexual ficam invisibilizados. E por isso, julgou importante sua participação na audiência. Ele divulgou sua criação, a peixinha DoroTea, que é autista, apresentada em escolas em conversas com alunos e professores, apresentando a questão de forma lúdica. 

Ao final da reunião, Cristiano Silveira anunciou requerimentos de providências. Entre eles, será enviada solicitação quanto ao PAR Digitall: à SEE, para que faça sua adesão ao projeto, e à Associação Mineira de Municípios (AMM), para que incentive seu uso nos municípios. Ainda requereu à SEE que crie cursos de Terapia ocupacional (TO) e de fonoaudiologia nas faculdades da UEMG, especialmente em Divinópolis. 

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