Educação é vista como caminho contra violência doméstica

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Abordagem do tema nas escolas através da Lei Maria da Penha foi defendida, e iniciativas de ensino foram apresentadas.

A naturalização da violência contra a mulher foi um dos pontos abordados e condenados na discussão desta quarta (25) – Foto: Daniel Protzner

Ações educativas sobre violência doméstica com o uso de diferentes recursos, como quadrinhos e vídeo, e depoimentos de mulheres que sobreviveram aos abusos foram apresentados em reunião da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). A reunião, realizada na tarde desta quarta-feira (25/8/21), tratou da necessidade de se incluir, na grade curricular do ensino básico, noções sobre a Lei Maria da Penha.

Autora do requerimento que deu origem à audiência, a deputada Ana Paula Siqueira (Rede) salientou que está em tramitação na Casa o Projeto de Lei (PL) 99/19, de sua autoria, que visa incluir o conteúdo sobre a lei no currículo das escolas estaduais. A parlamentar falou da importância de se discutir as medidas educativas com a sociedade e, por isso, a importância de se conhecer as iniciativas já em andamento.

Superar a cultura que naturaliza a violência contra a mulher é, para Ana Paula Siqueira, urgente e, por isso, as políticas educacionais precisam incluir essa pauta em seu planejamento. Professora por mais de duas décadas, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) concordou com a colega: “É com educação que vamos combater todos os ódios e preconceitos”, disse.

Beatriz Cerqueira disse, ainda, que grupos de extrema direita tem tentado deturpar os debates feitos nas escolas, dizendo que discutir questões sobre gênero significa mudar a orientação sexual dos alunos. Ela ressaltou que é preciso discutir gênero para que as crianças e os adolescentes entendam o que é, quais são as causas e quais são as saídas para a violência de gênero.

Os ataques desses grupos, porém, tem deixado, segundo a parlamentar, muitas professoras acuadas. Mas, apesar disso, Beatriz Cerqueira ressaltou que é preciso disputar o currículo com aqueles que não querem que debates sobre questões como violência doméstica sejam feitos. Para ela, a omissão sobre esse assunto fará de todos “partícipes na construção de uma sociedade cada vez mais violenta”.

Iniciativas estaduais – A coordenadora de Temáticas Transversais e Transversalidades Curriculares da Secretaria de Estado de Educação (SEE), Fabiana Benchetrit dos Santos, fez um relato sobre ações realizadas pelo governo estadual, desde 2018, para promover os direitos humanos, especialmente das mulheres. Entre as iniciativas estão concursos de vídeos e de redações sobre o tema.

A representante do Secretaria de Educação também ressaltou que em 2019 a pasta aderiu ao Sistema Estadual de Redes em Direitos Humanos (SER-DH), da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese), para ter diagnóstico da violação de direitos no Estado, acolher os estudantes em situação de violência e fazer o encaminhamento deles para a rede de proteção social.

Fabiana Benchetrit informou, ainda, que a secretaria também já está fazendo seleção de projetos de iniciação científica sobre o tema mulheres na ciência e assuntos voltados para a prevenção das violências e convivência democrática.

Municípios já têm iniciativas para a educação contra a violência doméstica

As convidadas fizeram coro com as parlamentares e apresentaram algumas iniciativas já em andamento. A promotora de Governador Valadares (Rio Doce) Carla Regina Duvanel, por exemplo, falou sobre um vídeo exibido na TV Escola para os alunos que, em função da pandemia, estão estudando em regime remoto.

Mostrado durante a reunião, o vídeo fala sobre o que é violência doméstica, incluindo seus cinco tipos (violência psicológica, moral, patrimonial, sexual e física), bem como as formas de denunciar e procurar ajuda.

A estratégia foi aproveitar o ensino remoto, que na maioria das casas é acompanhado pelas mães, para conscientizar crianças e suas mães sobre a questão. De acordo com a promotora, a proposta do vídeo surgiu em reunião de uma rede de articulação de atores de diferentes órgãos públicos que atuam na implementação da Lei Maria Penha.

A apresentação da Lei Maria da Penha em formato de quadrinhos foi uma das iniciativas mostradas na reunião – Foto:Daniel Protzner

Elogiando a iniciativa, a deputada Ana Paula Siqueira falou sobre a importância de se encontrar linguagens que consigam comunicar com os adolescentes para que as aulas sobre o assunto não sejam inócuas. Nesse sentido, ela apresentou a cartilha Lei Maria de Penha em Miúdos, desenvolvida pela Escola do Legislativo de Pouso Alegre, que trata da norma em formato de quadrinhos.

A parlamentar elogiou o comprometimento de atores municipais com a pauta. Em consonância com essa percepção, os vereadores de Guaranésia (Sul) Luiz Alberto de Souza e Leandro Altineli da Silva também falaram de projeto de lei que apresentaram na câmara municipal no sentido de incluir, também nos currículos das escolas municipais, noções sobre a violência doméstica.

Sobreviventes da violência doméstica comentaram a Lei Maria da Penha

Fernanda Gomes é uma das sobreviventes que deu depoimento na reunião. Ela foi vítima de violência por seu ex-companheiro e depois por seu genro, quando tentou salvar a filha, Esther Gomes. A filha, porém, não sobreviveu, e Fernanda falou da sua luta para conscientizar as mulheres para que elas reajam antes que seja tarde demais.

Fernanda, porém, demonstrou descrença com a Lei Maria da Penha, apontando que muitas mulheres que já têm medidas protetivas contra os agressores e, mesmo assim, voltaram a ser agredidas ou até assassinadas. Ela elogiou a Lei do Feminicídio, que aumentou a pena para os responsáveis, mas ressaltou que “lei não garante a vida das mulheres”.

A promotora Carla Duvanel, porém, disse que, segundo pesquisa da Polícia Civil de Minas Gerais, 89% das vítimas de feminicídio nunca denunciaram os agressores. Isso seria, segundo ela, um indicativo de que as medidas protetivas, embora não funcionem sempre, funcionam na maioria das vezes.

Ela explicou que, antes da Lei Maria da Penha, o crime de ameaça não gerava nenhuma medida para afastar o agressor. Agora, caso as medidas protetivas sejam desrespeitadas, o acusado pode ser preso preventivamente.

Quem também contou a sua história foi a juíza da Vara Criminal de Belo Horizonte, Luziene Lima. Ela contou que foi vítima de diversas violências perpetradas pelo seu primeiro marido, ainda na década de 1970. Ela salientou que, naquela época, décadas antes da Lei Maria da Penha, ela nem identificava as agressões psicológicas e patrimoniais e só tomou a iniciativa de se separar quando uma agressão física quase a matou.

Nesse sentido, a convidada destacou os ganhos trazidos pela legislação e disse que a própria descrição legal dos diferentes tipos de violência já é um passo fundamental. Ela defendeu que a educação para a compreensão da violência doméstica seja institucionalizada por meio de lei.

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