Deputados da CPI fecham o cerco contra uso político da Cemig

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Executivo da IBM não consegue justificar motivo de subcontratação de empresa ligada a ex-secretário do governo Zema.

O executivo da IBM Brasil, Marcelo Moura (à esquerda), consulta seu advogado durante o depoimento aos deputados que integram a CPI da Cemig – Foto: Guilherme Bergamini

De um lado, ausência de explicações ou respostas evasivas. Do outro, mais indícios de que a parceria bilionária firmada entre a Cemig e a IBM Brasil Indústria, Máquinas e Serviços, braço da multinacional de tecnologia, realizada sem licitação e pelo prazo inédito de dez anos, pode ter dado margem a diversas ações de uso político da estatal, representando mais prejuízos ao seu principal acionista, a população de Minas Gerais.

Esse foi o saldo do interrogatório, na manhã desta terça-feira (5/10/21), do vice-presidente da área de Consultoria da IBM Brasil, Marcelo Flores de Moura, pelos deputados que compõem a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) que investiga possíveis irregularidades na atual gestão da Cemig.

Ao longo de mais de três horas de depoimento, na condição de testemunha e acompanhado por um advogado, o executivo da IBM Brasil tentou justificar, sem muito sucesso, que a parceria firmada com a companhia energética do Estado aconteceu dentro da legalidade e representará mais eficiência no atendimento aos clientes. No entanto, ele nem sequer soube detalhar o prazo e valores envolvidos na subcontratação da empresa de call center AeC, fundada por Cássio Azevedo, ex-secretário de Desenvolvimento Econômico do governador Romeu Zema.

A AeC, citada em vários depoimentos já prestados na CPI, já desempenhava a mesma atividade para a Cemig desde setembro de 2008, por três contratos, e foi subcontratada pela IBM no início deste ano, mesmo após ter perdido licitação no ano passado para continuar prestando o mesmo serviço. Uma das linhas de investigação da CPI é o aparelhamento político da empresa por dirigentes do Partido Novo, o mesmo do governador.

Advertência

Diante das respostas vacilantes do depoente, o presidente da CPI da Cemig, deputado Cássio Soares (PSD), chegou a adverti-lo e interrompeu a reunião para que o executivo da IBM Brasil pudesse apurar as informações e responder com mais precisão às dúvidas dos deputados, o que acabou não acontecendo.

Ele alegou ter se envolvido na parceria entre Cemig e IBM somente a partir da segunda quinzena de novembro do ano passado, quando a negociação já estaria alinhavada. Mesmo assim, conforme alegou, o setor jurídico da multinacional de tecnologia, ao ser consultado por ele, teria dado aval à continuidade ao acordo. Segundo o depoente, outras cinco grandes empresas de tecnologia teriam sido consultadas antes da IBM assumir a parceria, o que em tese configuraria uma concorrência.

Sobre a contratação da AeC, Marcelo Moura disse desconhecer que haveria uma outra empresa que teria vencido a licitação para call center, oferecendo um preço mais barato, e admitiu que a IBM não consultou o cadastro da Cemig de empresas fornecedoras deste tipo de serviço. 

“Percebemos que o melhor era manter o fornecedor de atendimento telefônico, para não causar uma disrupção no serviço”, apontou.

Depoente nega pressão para manter empresa que perdeu licitação

O executivo da IBM também negou ter sofrido qualquer tipo de pressão para manter a AeC, alegando não ter tomando conhecimento das declarações dadas à CPI da Cemig pelo ex-diretor-adjunto de Suprimentos, Logística e Serviços Corporativos da empresa, João Polati Filho, que denunciou ter sido diretamente e veementemente pressionado pelo presidente da Cemig, Reynaldo Passanezi Filho, para que “encontrasse uma forma” de manter o vínculo contratual com a empresa do ex-secretário de Zema.

“São tantas coincidências que já levantamos, que gostaria de saber se o jurídico da IBM ainda avalia que não há incompatibilidade nessa situação. Entre elas essa de o presidente da Cemig pedir para dar um jeito da AeC continuar, jeito que acabou sendo dado, mais uma coincidência. Na prática, firmaram uma parceria que vai permitir à Cemig ficar livre dessa chatice chamada licitação, pois basta a Cemig indicar, que a IBM vai contratar”, criticou o relator da CPI, deputado Sávio Souza Cruz (MDB).

A suspeita de aparelhamento político da companhia já havia sido reforçada com a confirmação nas oitivas de que Cássio Azevedo, já falecido, mesmo sem ser funcionário da estatal, chegou a ter uma sala reservada no 18º andar do edifício-sede da Cemig, a pedido do atual diretor-presidente. O depoente também disse desconhecer esse fato.

Contraponto

Ao contrário dos colegas, os deputados Zé Reis (Pode) e Zé Guilherme (PP) defenderam a parceria entre IBM Brasil e Cemig, já que o modelo antigo remunerava por atendimento realizado, independentemente da taxa de resolutividade. Ao responder perguntas desses parlamentares, o depoente destacou que foi estimada a economia de R$ 500 milhões, em virtude da substituição de outros 14 contratos.

“Antes, a Cemig pagaria o mesmo sem resolver, pois o taxímetro continuava ligado. Com a Cemig, a IBM só paga se o problema do cliente for resolvido”, apontou Zé Guilherme.

Comissão vai investigar se outras empresas foram lesadas

O presidente da CPI da Cemig, Cássio Soares, revelou, ao longo da reunião, que a comissão já recebeu outras denúncias de empresas que, apesar de participarem de licitações da estatal, teriam sido preteridas em nome de subcontratações suspeitas.

“Já sabemos que a Audac não foi a única prejudicada e vamos investigar. A desculpa de buscar uma Cemig mais eficiente não pode servir de justificativa para burlar a lei”, afirmou.

A Audac, vencedora da licitação do call center, ameaça cobrar na Justiça mais de R$ 13 milhões por investimentos já realizados. O temor aí é que outras empresas também possam vir a acionar a Cemig na Justiça.

Essas novas denúncias a serem investigadas pela CPI da Cemig foram confirmadas pelo vice-presidente da CPI, deputado Professor Cleiton (PSB), e pela deputada Beatriz Cerqueira (PT). “Estamos presenciando um dos maiores escândalos corporativos da história do Brasil. E colocaram o senhor (em alusão ao depoente) numa fria, porque parece não ter participado de nenhuma dessas tratativas podres”, afirmou Professor Cleiton.

Evasivas

Pressionado por Beatriz Cerqueira a indicar outro dirigente da IBM que pudesse dar mais detalhes sobre o que teria sido acertado nos bastidores entre a multinacional e a Cemig, Marcelo Moura deu mais uma resposta evasiva. “Não sei quem cuidou especificamente dessa negociação, pois nosso time de compras que analisou a proposta tem entre 30 a 40 pessoas”, relatou.

A parlamentar ainda questionou o depoente sobre o motivo do suposto desmonte do setor responsável pela fiscalização de contratos da Cemig, e a pedido da direção da IBM Brasil, outra denúncia que chegou ao conhecimento dos deputados da CPI. Marcelo Moura confirmou o procedimento, que se justificaria em virtude de, na parceria celebrada, a IBM ter assumido diversas funções que antes deveriam ser da estatal.

“Não é uma requisição nossa, mas uma consequência, já que assumimos atividades da própria Cemig que antes eram abrangidas por outros contratos”, apontou. Segundo ele, isso não representa nenhum risco à estatal, já que estão previstos indicadores claros e, em sua maioria, automatizados para o cumprimento de metas.

Requerimentos

Apesar disso, entre os requerimentos aprovados ao final da reunião estão pedidos para que a direção da Cemig encaminhe à CPI informações sobre todos os contratos já rescindidos ou que ainda o serão em virtude da parceria celebrada com a IBM, assim como a judicialização da licitação descartada com a Audac e seu impacto econômico-financeiro.

Também convocada para prestar depoimento nesta terça (5), outra executiva da IBM, Thais Lima de Marca, apresentou atestado médico à presidência da CPI da Cemig e teve seu pedido de adiamento acatado.

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