Custos
com os sinistros envolvem reparos de pavimentação, saúde das vítimas e questões
previdenciárias Por Gabriel Rezende
Nove mortes por dia e gastos que, em 2024, devem superar R$ 5 bilhões. Em Minas Gerais, essas são consequências dos acidentes de trânsito, principal causa de morte entre pessoas de 5 a 29 anos no mundo. Em meio ao Maio Amarelo, mês destinado à conscientização sobre a segurança no trânsito, especialistas reforçam não haver preço para a tentativa de salvar uma vida. Contudo, os custos com os sinistros, quase sempre evitáveis, oneram os cofres públicos.
A estimativa de gastos com os acidentes de trânsito é do Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV) e corresponde a uma projeção apresentada para a década entre 2018 e 2027, com base no número de mortes previstas (mais de 3 mil). Conforme a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), entre 2015 e 2023, 31.290 pessoas morreram por acidentes de transporte terrestres, uma média de 9 por dia. Em 2023, foram 3.375 óbitos.
Além das mortes, entre 2015 e 2023, Minas Gerais registrou 211.641 vítimas de acidentes de trânsito que precisaram de internação hospitalar. “Um acidente de trânsito não afeta apenas a vítima e seus familiares, mas gera impactos sociais capazes de afetar a economia, principalmente nos casos de invalidez ou morte”, analisa o ONSV.
Apenas em rodovias federais, em 2022, último ano disponibilizado pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), o gasto com acidentes para os cofres públicos em Minas Gerais foi de R$ 1,69 bilhão, o maior dentre todos os estados. Naquele ano, MG registrou 8.290 acidentes (7.849 com vítimas) e 701 mortes em estradas federais. No país, foram gastos R$ 12,92 bilhões com acidentes, segundo o mesmo levantamento — o valor é quase 100% maior do que o investido, em 2021, pela União na malha pública federal (R$ 6,51 bilhões).
Vários fatores podem tornar os custos por vítima de acidentes mais elevados. São consideradas a dinâmica do acidente, que pode demandar reparos de pavimento; a operação de resgate, que pode contar, por exemplo, com uso de helicóptero; e as lesões. Todos esses elementos se somam aos custos de internação e possíveis sequelas, explica Alisson Coimbra, diretor científico da Associação Mineira de Medicina do Tráfego (Ammetra).
“Esses eventos evitáveis de trânsito consomem gastos proporcionais à complexidade que exigem. É uma cascata de gastos”, analisa. Não há valor financeiro que represente a tentativa de salvar uma vida. Coimbra, no entanto, convida as pessoas a refletirem sobre comportamentos no trânsito, seja enquanto pedestre ou condutor de algum veículo, que podem minimizar situações de risco e evitar graves sequelas e mortes.
“Estamos falando de uma mudança súbita do perfil socioeconômico. Um acidente pode interferir em toda questão de renda. Inclusive de familiares, que também vão ter que deixar o trabalho para acompanhar [em uma possível internação]. Há lesões permanentes que incapacitam e causam perda da força produtiva”, acrescenta, mais uma vez classificando os acidentes como “eventos evitáveis de trânsito”.
Saúde pública
Os gastos com a saúde pública, além de gastos previdenciários, são as principais despesas envolvendo vítimas de acidentes de trânsito. As ocorrências podem demandar cirurgias complexas e uma longa recuperação, sob cuidados intensivos. No Hospital da Baleia, na região Leste de Belo Horizonte, referência no Estado para cirurgias ortopédicas, cerca de 60% dos atendimentos são voltados para pessoas envolvidas em acidentes de trânsito.
“As pessoas não imaginam o tamanho do impacto. É uma cadeia de coisas que começa com os custos da estrutura hospitalar e segue com a rede previdenciária, diminuição da capacidade de produção econômica”, analisa o Coordenador do Serviço de Ortopedia e Traumatologia, dr. Wagner Nogueira.
Como exemplo, o médico cita as cirurgias eletivas. Não fosse a demanda dos acidentes, a capacidade de atendimento do Hospital da Baleia, que em 2023 realizou 15 mil cirurgias, poderia ser direcionada para as pessoas que aguardam pelo procedimento. Questionada, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), disse não ter dados sobre a quantidade de pessoas que aguardam por procedimentos cirúrgicos no Estado e que a gestão das filas são de responsabilidade das Secretarias Municipais de Saúde (SMS).
No entanto, matéria publicada pelo próprio governo de Minas, em fevereiro deste ano, mostrou que somente no Norte do Estado cerca de 36 mil pacientes aguardavam por cirurgias. Em Belo Horizonte, um dos principais polos com hospitais para realização de cirurgias, cerca de 28 mil pessoas estão cadastradas na Central de Internação para realizar cirurgia eletiva, considerando, residentes da capital e dos municípios pactuados. Os dados mostram o cenário parcial das filas em Minas.
A dor da imprudência
O motociclista Vanderley de Brito dos Santos, de 41 anos, é parte da triste estatística das pessoas que sofrem com consequências de acidentes de trânsito. E também dos sinistros evitáveis. Em agosto de 2022, ele fraturou as das pernas e a bacia após ser atingido por um carro que estava na contramão em Joaíma, no Vale do Jequitinhonha.
“É complicado porque eu não tive culpa nenhuma. Sempre tive muito respeito pelo trânsito”, lamenta. Mesmo com quase dois anos do acidente, o tratamento segue. Uma nova cirurgia está prevista para ser realizada no Hospital da Baleia, para colocar uma barra paralela fixadora na perna esquerda. Também vão ser feitos outros procedimentos, que incluem uma prótese no joelho.
Compromisso para redução de mortes
A segurança no trânsito é uma preocupação mundial. Em 2021, a Organização Mundial da Saúde (OMS) apresentou a meta de prevenir, pelo menos, 50% das mortes e lesões no trânsito até 2030. O Brasil foi um dos países que se comprometeu com esse objetivo. Contudo, os números indicam crescimento de óbitos nas rodovias federais.
No País, 5.396 pessoas morreram em acidentes em rodovias federais em 2021. Em 2023, o número subiu para 5.615, crescimento de 4,06%. Em Minas Gerais, também houve aumento na comparação do mesmo período: de 693 para 727, alta de 4,91%. Os dados são do painel disponibilizado pela Confederação Nacional do Transporte (CNT).
Como parte dos compromissos para reduzir os acidentes e as mortes no trânsito, o governo de Minas Gerais aposta em campanhas de conscientização. Segundo o Executivo estadual, foram destinados R$ 48 milhões para elaboração de um plano de ação, organizado de maneira descentralizada pelos municípios, com apoio técnico das Unidades Regionais de Saúde (URS).
“A ideia é que todos os municípios desenvolvam programas e projetos de intervenção que reduzam os acidentes de trânsito em seus territórios e que conscientizem os munícipes da importância do papel de cada um para essa redução”, explica a coordenadora de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis da SES-MG, Sandra de Souza.
Respeite as leis de trânsito
Planejamento da viagem, respeito às leis de trânsito, direção defensiva e manutenção e revisão dos veículos evitam acidentes, adverte o tenente André Muniz, do Comando de Policiamento Rodoviário da Polícia Militar Rodoviária (PMRv).
“O condutor deve dirigir sempre pensando no que pode acontecer de errado, como uma frenagem brusca do veículo que está à frente”, orienta. O veículo deve estar com a manutenção em dia. Os pontos de alerta estão relacionados aos equipamentos obrigatórios, como luzes, espelhos e limpadores de para-brisa, além dos pneus.
Além disso, o militar faz um apelo para que as pessoas não dirijam após ingerir bebida alcoólica. A prática, além de suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e multa de R$ 2.934,70, pode ser enquadrada como crime de trânsito e resultar em prisão.
Extraído do Jornal O TEMPO