Evento internacional de artes cênicas terá também intervenção na praia de Copacabana
RIO — Após sete anos de abandono, o Teatro Villa-Lobos, no Leme, voltará a abrir as portas. Ou melhor, as ruínas do Teatro Villa-Lobos. Fechado desde que pegou fogo, em 2011, o espaço servirá de cenário para “A única coisa que necessita uma grande atriz é uma grande obra e vontade de vencer”. Apresentada pela companhia mexicana Vaca 35 Teatro en Grupo, a peça é inspirada no clássico “As criadas”, de Jean Genet. E terá três apresentações, gratuitas, nos dias 26, 27 e 28.
A ocupação do espaço faz parte da 9ª edição do Tempo Festival, uma das mostras internacionais de teatro mais importantes do Rio, que acontece de sexta (19/10) até o dia 28.
Nossa intenção é reforçar esse movimento de ocupação — diz Márcia Dias, uma das curadoras do festival, ao lado de Bia Junqueira e Cesar Augusto. — É uma forma de jogar luz sobre esse teatro para que a cidade perceba a importância dele. Estamos apostando que ele possa vir a ser restaurado e devolvido para a população, como aconteceu com os armazéns do Porto, por exemplo.
O ABANDONO DO TEATRO VILLA-LOBOS
Fechado desde 2011, após um incêndio que destruiu suas instalações, o edifício, em estilo modernista, está abandonado e virou depósito de lixo e abrigo para moradores de rua. Lá dentro, há objetos como colchões velhos, aparelhos de TV quebrados, galões, canos, garrafas plásticas e restos de alimentos que, segundo moradores, pertencem a moradores de rua que costumam dormir no endereço. O cenário lastimável já ganhou as redes sociais, num vídeo que, em três dias, já teve mais de 48 mil visualizações. Comerciantes e moradores da vizinhança convivem com o problema de perto. E reclamam que, por causa de um alagamento, uma sala subterrânea abriga uma enorme “piscina”, transformada em foco de dengue. Nos fundos do terreno, há um matagal, que, dizem os vizinhos, virou esconderijo de ratos.
As ruínas do Villa-Lobos não são o único cenário inusitado do festival. A 500 metros dali, as areias de Copacabana vão virar cenário de performances a partir desta sexta. “A praia e o tempo” acontece no Posto 2, numa instalação criada pelo arquiteto e artista carioca Pedro Varella, uma área de 900 m², onde bancos de areia foram formados com uma retroescavadeira. Também gratuito, o espetáculo é encenado pela coreógrafa francesa Julie Desprairies.
Nove países envolvidos
“A praia e o tempo” reflete sobre a incerteza do presente, enquanto “A única coisa que necessita uma grande atriz é uma grande obra e vontade de vencer” aponta para o teatro como única saída possível.
— Queremos refletir sobre a fragilidade da cena cultural carioca — explica Márcia. — Estamos cada vez mais nesse território da instabilidade, sem saber para onde estamos indo. Precisamos ter esse diálogo com a cidade, chamar as pessoas para viver essa experiência.
Com participantes de nove países (Brasil, França, Uruguai, México, Colômbia, Polônia, Croácia, Suíça e Alemanha), o festival terá também residências artísticas e atividades de formação. Uma das principais parcerias internacionais é o Studio Cabaret Voltaire, inspirado na casa homônima de Zurique, na Suíça, que foi berço do movimento dadaísta nos anos 1920. Nesse projeto, artistas do Rio, de Minas e de São Paulo, além de dois suíços, vão apresentar performances que dialogam entre si no teatro, na varanda e no café do Oi Futuro.
A busca de colaboradores estrangeiros foi uma das soluções para garantir a realização do festival, já que as verbas públicas e os patrocínios para cultura andam escassos.
— Nossa curadoria deste ano tem como mote a palavra “presente” — conta Cesar. — Queremos resistir e persistir com os nossos ideais. Temos de enfrentar as dificuldades olhando para o que está acontecendo agora e ocupando a cidade.
Transcrito do jornal O Globo