Depoimentos serão de assessora que teria acompanhado investigadores externos e de ex-superintendente jurídico.
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) que investiga possíveis irregularidades na gestão e uso político da Cemig interroga, nesta segunda-feira (13/9/21), mais dois executivos da companhia energética do Estado. A partir das 14 horas, no Auditório José Alencar, serão ouvidos, na condição de testemunhas, a assessora da Diretoria de Regulação e Jurídica Virginia Kirchmeyer Vieira, e o ex-superintendente jurídico Thiago Ulhoa Barbosa.
Ambos estariam envolvidos em uma rede de intrigas na área jurídica da Cemig e que teria resultado até em um episódio de espionagem de quem se opunha à flexibilização dos mecanismos de controle que impediriam a assinatura de contratos bilionários sem licitação.
A trama foi revelada na tarde da última quinta-feira (9) pelo ex-titular da Gerência de Direito Administrativo da Cemig, Daniel Polignano Godoy, que, ainda no exercício do cargo, teve seu computador invadido e arquivos copiados por agentes da Kroll Associates Brasil, empresa especializada em investigações corporativas.
A empresa, que já é suspeita de espionar deputados estaduais, não tinha sequer um contrato firmado que garantisse a confidencialidade das informações obtidas, conforme informou à CPI da Cemig o ex-executivo espionado.
Ao saber do episódio, os deputados lembraram que a Cemig é uma das principais empresas de energia do País, que disputa um mercado acirrado e tem até ações listadas na Bolsa de Nova Iorque (EUA), o que torna temerário qualquer vazamento de informações sensíveis.
Os dois executivos a serem interrogados nesta segunda estariam diretamente envolvidos no episódio de “arapongagem”, conforme informou Daniel. A assessoria de diretoria Virgínia teria sido flagrada pelas câmeras de vigilância da estatal acompanhando os “espiões” da Kroll pelos corredores do edifício-sede da Cemig na madrugada do dia 3 para 4 de dezembro do ano passado, quando o então gerente de Direito Administrativo teve seu computador invadido.
A gravação foi obtida pelo executivo espionado, que vai entregá-la nos próximos dias aos deputados da CPI da Cemig para ser periciada. Requerimento para que o diretor-presidente da Cemig, Reynaldo Passanezi Filho, também entregue o flagrante do sistema de vigilância da Cemig foi aprovado pelos deputados. O prazo para ambos fazerem isso é de cinco dias.
O outro interrogado desta segunda, o ex-superintendente Jurídico Thiago Barbosa, seria o chefe imediato de Daniel e, segundo este último declarou aos deputados, ao ser questionado, disse não saber de nada, mesmo com aparente apoio da Diretoria Jurídica aos investigadores da Kroll. Estes, no entanto, deixaram um formulário no computador de Daniel informando a vistoria no equipamento, o que levantou as suspeitas de Daniel, que, como advogado da Cemig, apurou então que a Kroll não tinha contrato ainda com a companhia e, depois, obteve o vídeo incriminador.
Posteriormente, superiores hierárquicos teriam reconhecido a investigação, mas tentaram tranquilizá-lo que ele não era o alvo. O ex-gerente informou que o seu computador de trabalho continha na época grande volume de informações, muitas delas sensíveis e com dados pessoais dele e de terceiros, já que lidava com as contratações da Cemig, com ou sem licitação.
Outra complicação lembrada pelos deputados envolve a prerrogativa de sigilo profissional na prática da advocacia, garantida, entre outros, pelas normas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Investigação – A investigação da CPI da Cemig segue a linha de que o ex-executivo, servidor de carreira da empresa desde 2013, poderia estar sendo vítima de uma tentativa de intimidação. Segundo Daniel relatou aos deputados, ele e sua equipe eram responsáveis pela elaboração de pareceres jurídicos prévios que embasavam as contratações sem licitação da Cemig.
Mas, conforme revelou, por decisão da diretoria executiva e do Conselho de Administração da Cemig, os pareceres jurídicos justificando a “inexigibilidade de licitação” passaram a ser emitidos posteriormente à celebração de contratos. Uma das empresas contratadas dessa maneira foi justamente a Kroll.
A prática, conhecida como “convalidação”, é a regularização de contratações depois dos serviços contratados já terem sido executados, expediente que deveria ser utilizado somente em situações emergenciais. O ex-gerente de Direito Adminsitrativo foi demitido do cargo pelo diretor jurídico Eduardo Soares, segundo declarou em depoimento, por “ter visões diferentes de como a Cemig deveria funcionar”.
Por isso, a reunião da CPI da Cemig desta segunda buscará esclarecer informações sobre as contratações diretas realizadas pela empresa, sem licitação, e sobre o preenchimento de cargos técnicos por não concursados, ambos os problemas registrados a partir de 2019.
Críticas – O relator da CPI da Cemig, Sávio Souza Cruz (MDB), lembrou dois seriados antigos da TV, Agente 86, com seus espiões trapalhões, e Túnel do Tempo, para exemplificar a irresponsabilidade com que a estatal vem sendo conduzida na atual gestão.
“A Cemig é mesmo uma empresa muito avançada tecnologicamente, porque agora viaja no tempo, lá deve existir o Túnel do Tempo, que para os demais mortais só anda pra frente, mas, para a empresa, não”, ironizou, ao criticar a prática discriminada de convalidação.
“No Agente 86, pelo menos eles tinham outro túnel, o do silêncio (que impedia o vazamento de informações), mas na Cemig não”, completou, sobre o flagra de espionagem na Cemig.