Por Debora Ghelman, advogada especializada em Direito Humanizado
Infelizmente, o coronavírus está
causando um estrago a nível mundial. Foi responsável pela queda da Bolsa de
Valores, pelo fechamento das fronteiras de diversos países, pela
obrigatoriedade das pessoas contaminadas cumprirem quarentena, pela suspensão
das atividades escolares, pela demissão de vários funcionários, pela proibição
de visita aos presidiários, além de muitos outros efeitos.
E no Direito de Família, quais serão os impactos? No meu ponto de vista, várias
áreas da família serão diretamente impactadas. Primeiro, a determinação do
governo com o aval da própria população para as pessoas permanecerem o maior
tempo possível em seus lares, no intuito de evitar contaminações, aumentará o
convívio entre os casais.
Por um lado, o aumento dessa convivência poderá gerar um impacto positivo na
vida afetiva e sexual do casal, essa intimidade será uma oportunidade para o
casal dialogar com mais intensidade e permanecer mais tempo junto no seio de
seu núcleo familiar. Isso sem contar na possibilidade de muitos filhos serem
gerados.
Todavia, o aumento dessa convivência poderá também ensejar mais conflitos entre
os casais, principalmente, em relação aos que já vivenciam alguma crise no
relacionamento. Consequentemente, muitos divórcios poderão ocorrer. Foi o que
aconteceu na China. Com o aumento significativo nos pedido de divórcios. Por
sua vez, no Brasil, a estatística é de que um em cada três casamentos termina
em divórcio. Será que o aumento desse convívio forçado será estopim para
futuros pedidos de divórcio?
Uma outra questão a ser considerada é que o coronavírus está gerando uma crise
econômica imensurável. Isso significa economia estagnada, com menos vendas no
comércio, aumento do desemprego e redução da renda dos patrões e empregados. E
qual consequência disso tudo no Direito de Família? Certamente, as pensões
alimentícias serão impactadas.
Importante esclarecer que a pensão alimentícia é arbitrada pelo juiz levando em
consideração a possibilidade de quem paga e a necessidade de quem pleiteia os
alimentos. Trata-se do conhecido binômio necessidade/possibilidade. E o valor
da pensão só poderá ser aumentado ou reduzido caso haja alguma alteração na
renda do devedor ou credor dos alimentos. Então, comprovada a redução na
capacidade econômica do devedor, bastante plausível que haja um pedido judicial
de revisão dos alimentos.
Obviamente, não basta alegar que o coronavírus gerou uma crise econômica e que
poderá haver uma redução na renda do devedor, sendo essencial demonstrar a
prova de tal redução através de documentos.
Ponto positivo: quem irá comemorar a presença dos pais em casa serão os filhos.
Com algumas empresas determinando que seus funcionários trabalhem em sistema de
home office, haverá aumento da convivência familiar entre os filhos e seus
pais. Pelo menos, serão mais nove horas de convivência familiar diária. Por
conseguinte, os pais participarão mais ativamente da vida de seus filhos,
aumentando a intimidade e proximidade entre eles. E haja criatividade para
inventar brincadeiras, atividades e auxiliar nos estudos das crianças!
Contudo, inevitavelmente, serão os idosos os mais impactados com o Covid-19.
Conforme noticiado pela mídia, vários asilos cancelaram a visitação dos
parentes dos idosos por estes pertencerem ao grupo de risco. Segundo os
médicos, estas são as maiores vítimas, os quais merecem maiores cuidados e
proteção e, a melhor alternativa, infelizmente, é evitar o contato com o maior
número de pessoas. Dessa forma, muitos idosos que vivem sozinhos deixarão de
receber visitas em suas casas, ficando cada vez mais isolados. Este isolamento
pode trazer sentimento de abandono, desamparo e solidão, o que contraria as
normas do Estatuto do Idoso. Essa será uma triste realidade para quem está na
terceira idade.
No entanto, não posso deixar de mencionar que ainda existem pessoas solidárias
que utilizam a criatividade para o bem estar do próximo. Como exemplo, posso
citar a existência de um projeto criado por duas mulheres a título de trabalho
voluntário, o qual pode ser encontrado no site saudeeenvelhecimento.com.br/anjo, incentivando as pessoas a serem o “anjo da guarda” de um
idoso. Essa idéia funcionará da seguinte forma: o whatsaap será utilizado para
se comunicar com um idoso conhecido que mora sozinho, a fim de apoiá-lo,
procurando saber como ele está e como passou o dia. Excelente idéia, contudo, a
maioria dos idosos ainda sofre com a dificuldade lidar com a tecnologia.
Como vemos, a ocorrência de um evento inesperado como o coronavírus gera o
chamado efeito borboleta. O vírus infecta um único indivíduo na China e ele
contamina outras pessoas. De repente, o vírus se alastra de forma tão rápida
que acaba ultrapassando as barreiras globais. Finalmente, quase todos os países
são infectados. Por conseguinte, a economia mundial é atingida e todas as
esferas políticas, econômicas, legais e sociais são afetadas. E o Direito de
Família também acaba sofrendo um grande impacto, assim como todas as outras
áreas do Direito Brasileiro.
Gosto sempre de lembrar que crises são oportunidades e, no Direito de Família,
o “efeito coronavírus” certamente será uma oportunidade para que
todas as relações familiares sejam revistas, aprimoradas e, quem sabe,
reconstruídas.
*Debora Ghelman é advogada especializada em Direito Humanizado nas áreas
de Família e Sucessões, atuando na mediação de conflitos familiares a partir da
Teoria dos Jogos.
Fonte: Mariana Mimoso mariana.mimoso@digitaltrix.com.br – enviosrp.com